Regina Fernandes
Vem sendo noticiado nas
redes de notícias evangélicas online, que está acontecendo um avivamento entre
a comunidade acadêmica na Universidade Asbury. Alguns relembram que em 1970
houve um fenômeno parecido na mesma universidade. Não há necessidade de negar
que o que está acontecendo naquele lugar, pois é ação divina, nem mesmo que
seja um avivamento da fé daquelas pessoas e daquela comunidade. Mas,
certamente, não se trata de um avivamento daqueles que se conta na história do
cristianismo e que, inclusive foi gerador do evangelicalismo, independente das
proporções que assumir e vou explicar por quê.
Avivamentos são “moveres”
(movimentos) do Espírito que revitalizam o ânimo de grupos e comunidades
diversas, sejam eles pentecostais ou não. Houve inúmeros na história do
cristianismo. Como movimento de Deus no mundo sempre possuem o lado divino e o
lado humano, tal qual a Bíblia, tal qual o próprio Jesus Cristo. O lado de
Deus, através do seu Espírito, é mover, animar, revitalizar por uma força
poderosa, pneumática ou não (no sentido pentecostal do termo) grupos diversos
que estão no seu seguimento. O lado do grupo é experienciar e decidir o que fará
com essa experiência. Sim, é possível e necessário pensar e decidir o que fazer
nesses casos! – Reforço isso porque sempre que pensamos no poder do Espírito
imaginamos algo tão controlador que perdemos toda capacidade de agir, de pensar,
de decidir e mesmo de interagir com o Espírito, e não funciona assim. Na
realidade, é essa compreensão equivocada que faz com que muitos
fundamentalistas acreditem que os profetas bíblicos foram tomados pelo Espírito
que ditava a eles o que pronunciar e escrever, de igual forma, muitos
pentecostais que entendem que o dom profético se dá da mesma maneira. Mas, Paulo
orientou a Igreja em Corinto sobre isso e explicou: “Pois vocês todos podem
profetizar, cada um por sua vez, de forma que todos sejam instruídos e
encorajados. Os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas. Pois Deus
não é Deus de desordem, mas de paz.” (1 Cor 14:31-33). Sua exortação faz
entender e nos ensina que ao humano é dado o direito e a possibilidade de
ordenar e direcionar a experiência para o bem da comunidade e do mundo: “de
forma que todos sejam instruídos e encorajados”.
Um avivamento não visa
o prazer individual ou mesmo de um grupo em uma forma privada e exclusiva, mas
é sempre para algo. Não é incorreto entender que em um tempo de tantas
perdas e dores devido à recente pandemia, guerras (Rússia e Ucrânia),
terremotos (Turquia e Síria), abandono e morte (Yanomamis e demais indígenas no
Brasil), guerras e fome (África) e tantas outras situações de sofrimento, o
Espírito não queira animar comunidades para que sejam boas novas de cuidado e
vida nessas situações. Mas o que será que farão com essa experiência em Asbury
e em outros avivamentos pelo mundo afora, ou o que já estão fazendo com ela?
Sobre outros
avivamentos, já ouvimos falar da reunião de oração pelas missões dos moravianos
que durou 100 anos; também sabemos do avivamento britânico no sec. XVIII que
inclusive deu origem ao metodismo e ao evangelicalismo, se espalhando por
várias regiões da Europa e depois na América do Norte, onde virou “avivamentismo”,
e como resultou no movimento missionário protestante moderno.
Ainda na esteira do
metodismo sabemos do Avivamento da Rua Azusa que originou o Pentecostalismo. No
Brasil e em outras regiões da América Latina e da África houve outro intenso avivamento
na década de 60 do século passado, que ficou conhecimento como Renovação Espiritual
e deu origem às igrejas renovadas de várias representações denominacionais
históricas tradicionais. Esse último resultou na realização por vários anos dos
famosos “Encontros de Avivamento”, onde denominações e igrejas se reuniam por
dias em algum lugar e experienciavam esse “mover do Espírito”. Certamente na África
isso ainda acontece com frequência entre vários grupos e nos pentecostalismos
latino-americano também é comum. Mas, qual a diferença em Asbury? Será o fato
de ser nos EUA e tudo o que acontece lá parece ser especial, universalizável e
normativo para os demais povos, principalmente em tempos de globalização “democrática”
onde os avivamentos nos EUA e Europa são noticiáveis e tomam as mídias enquanto em regiões da América Latina e África passam despercebidos? - Esperar para ver o que irão
fazer com essa experiência.
Precisamos lembrar que nossas pneumatologias contemporâneas chamam a atenção para aspectos importantes do mover do Espírito no mundo que não eram tão destacados em teologias mais antigas, principalmente aquelas que nos trouxeram do sul global. O Espírito Santo é sempre o Espírito da vida, Espírito Criador e Espírito que vitaliza a criação. Quando ele nos reanima é para sermos participantes dessa sua missão em prol da vida, onde e quando ela estiver ameaçada. Todo avivamento deve ter isso como critério de discernimento, o quanto ele nos move e nos permitimos mover nessa direção.
Uma coisa é certa, as
missões modernas que foram realizadas no impulso do avivamento evangelical, não
ouviram toda a orientação do Espírito ao animá-los em direção aos povos, pois ainda
que tenham trazido para as nossas regiões a fé evangélica e as suas igrejas, o
fizeram também no impulso e como braço religioso dos expansionismos econômicos
e culturais e imperialismos modernos, dos quais até hoje ainda somos
dependentes. É preciso, mesmo em avivamentos, se diferenciar o divino e o
humano, o trigo do joio, o bem do mal, pois o Espírito, por mais que se mova
poderosamente em nosso meio, não anula os nossos desejos e ações, pelos quais
sempre devemos ser responsáveis.
O Espírito age em nosso meio, certamente age, mas o que faremos em nossa parte desse mover?