terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

 


Povo de “dura cerviz”!

Regina Fernandes

 

Ainda ressoam as vozes dos seus profetas, eles não se calam,

ao povo que não era povo, que não tinha nome, que não tinha chão,

de ontem e de hoje.

E Amós grita em Israel,

-“Suspiram pelo dó da terra sobre a cabeça dos pobres...

E Miquéias grita em Judá,

- “As suas mãos estão sobre o mal e o fazem diligentemente;

o governante exige condenação; o juiz aceita suborno,

o grande fala dos maus desejos da sua alma, e, assim, todos eles urdem a trama.”

 

E os seus contadores de história e fazedores de culto,

no cerco e no pavor, visitam seus ancestrais,

e cantam e contam sua sabedoria,

desde as campinas de Moabe até a destruição.

Ergam sua voz Ancestros de nossa fé, contem essa história,

denunciem o mal hoje!

 

Assim, imaginamos essas vozes,

no entorno da fogueira, como em uma visão,

vozes escondidas nas letras, nas normas, nas regras, nos dogmas.

Vozes que contam que, há muito tempo atrás...

_ No movimento dos povos, ao som do lamento

 sobre os corpos dos jovens cananitas;

tomaste Canaã e mataste, e feriste, derrubaste os muros, as casas, as vidas;

não poupaste o ventre e nem as vozes cansadas.

Querias mais, matar a esperança,

ao se lançar como um lobo feroz,que devora a vida precoce, de inocentes, milhares deles.

 

Povo de “dura cerviz”,

Que revive sempre e sempre suas histórias,

Deus te quis justo. Mas, pisaste a Sedaqah,

 

E o Deus falante que te fala;

“Buscai o bem e não o mal para que vivam...”

“... que pratiques a justiça, e ames a misericórdia,

e andes humildemente com o teu Deus.”

 

Mas não o ouviste nos sábios,

ainda calaste os profetas,

Tapaste os ouvidos para o teu Sábio e Profeta.

Nem teu sofrimento, povo de “dura cerviz”,

que atravessa toda a sua história, que comove o Deus de seus ancestrais;

te move para a justiça, a misericórdia e a humildade da paz?

E, em nome do deus que criaste, de sangue, de guerra, de morte,

continuas a matar os teus cananeus, ao som do lamento

 sobre os corpos dos jovens; da destruição dos muros, das casas, das vidas;

dos ventres perdidos e do silêncio das vozes cansadas.

Continua a matar a esperança, ao se lançar como um lobo feroz

que devora a vida precoce, de inocentes, milhares deles, em Gaza.


domingo, 25 de fevereiro de 2024

 



MATEUS 5.27-32 - “Se preciso for, corta e joga fora”.


As leituras normativas e dogmáticas dos ensinos de Jesus podem induzir a erros em sua interpretação, pois como um sábio do seu tempo Jesus ensinava a partir das vivências de sua época, da cultura do povo judeu à qual pertencia e das suas regras sociais orientadas pela lei.

Nesse texto Jesus não está determinando uma regra de proibição ao divórcio ou contra o novo casamento, pois até em seu tempo isso era permitido. Mas, ele está corrigindo interpretações tendenciosas, que, como sempre, era realizada pelos homens, os favorecia e penalizava as mulheres.

Veja bem, as mulheres naquela sociedade do tempo de Jesus não podiam trabalhar, se autossustentar, sequer podiam ter vida social para além do interior do lar. Elas dependiam dos homens de sua vida, pai, irmãos e marido, para sobreviverem. Assim, uma mulher repudiada, além da vergonha social a que era exposta e rejeição da filha, não tinha como sustentar a si própria arriscando ter que buscar outros homens para sobreviver.  

Acontece que bastava “queimar uma panela de arroz” para ser repudiada, ou seja, elas estavam absolutamente nas mãos de seus homens e dos desejos deles, que manipulavam a lei em seu favor. Podiam olhar para outra mulher, desejá-la e arrumar desculpas para despedir a antiga companheira, legitimados por tais interpretações da lei.

Jesus percebeu isso! Ele identificou o injusto comportamento social da época e respondeu a ele. Ele mostrou como se devia interpretar aquela instrução da lei, e o texto coloca as duas instruções em sequência:

Primeiro: Não se trata de praticar o ato do adultério, mas qualquer que desejar outra mulher que não seja sua companheira já está praticando adultério. E o conselho dele é: controla aquilo que em você te leva a isso, através da figura “se preciso, corta e joga fora”.

Segundo: Não repudiem suas companheiras por razões fúteis. Lembrando aqui que naquela sociedade ela ficaria desamparada. Pois ela pode ter que se se envolver com outros homens para sobreviver (somente o homem era provedor).

Está claro que Jesus está defendendo as mulheres nesse texto, num contexto social que as colocava em absoluta dependência dos homens, portanto, de consequentes abusos.

Aprendemos muito com Jesus: 1) chega de interpretações tendenciosas do texto bíblico para validar praticar abusivas; 2) Tal qual Jesus, a leitura da Bíblia deve ser realizada pela Igreja e pelos pregadores para defender aqueles/as desfavorecidos na sociedade e libertá-los; 3) A boa leitura bíblica é denunciadora das injustiças; 4) Jesus era solidário às mulheres.

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